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Política

Política desigual distancia mulheres das eleições

Publicada em 08/03/24 às 09:30h - 8 visualizações

Por Emanuelle Vanderlei - colaboradora / Tribuna Independente


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Política desigual distancia mulheres das eleições
 (Foto: tribuna hoje)

A relação desproporcional entre o percentual de mulheres eleitoras e o percentual de mulheres que se elegem é um fenômeno bastante discutido no Brasil. Afinal, se elas são a maioria porque tem tão poucas representantes em cargos públicos? Podemos dizer que falta interesse das mulheres na política? O direito a votar e ser votada, sem precisar de autorização do marido, foi conquistado pelas mulheres no Brasil em 1934.

Naquele mesmo ano, Alagoas elegeu sua primeira deputada, Lily Lages, em 27 de novembro de 1934 com 13.981 votos. Depois de passados 90 anos, incluindo alguns contextos de golpe e retrocesso no país, a disputa das mulheres para ocupar os espaços de decisão ainda é difícil.

Em um levantamento realizado pela assistente social Highlany Ferreira, foi constatado que em todos os pleitos por cargos eletivos as mulheres saem em desvantagem. Apesar de ser 52,6% do eleitorado, apenas 33% das candidaturas em 2020 foram de mulheres em todo o país. Considerando as prefeitas eleitas naquele ano, mandatos que estão se encerrando em 2024, apenas 10% são mulheres. As vereadoras alcançaram um pouco mais de 34%.

No Congresso Nacional, hoje o Brasil tem 15% das cadeiras da Câmara dos Deputados e 12% no Senado ocupadas por mulheres. Nenhuma delas eleita por Alagoas.

“Mulheres fazem política antes mesmo da existência dos moldes partidários. O que de fato acontece é que a história brasileira tem sua base estruturalmente machista, racista, patriarcal e extremamente violenta, determinantes esses que justificam a ausência de maior representatividade feminina na política”, conclui Highlany. Ela vê que a política ainda é um ambiente negado a elas. “Podemos dizer que existe sim um interesse por política nas mulheres, ainda é pouco, mas existe! Porém, existem determinantes que tentam distanciar mulheres desse assunto e desse espaço”.

Considerando o cenário atual em Alagoas e a tentativa, mesmo que frustrada, de um número significativo de candidatas, ela vê sim interesse.

“A realidade nas urnas foi de nenhuma representatividade para o congresso nacional, afinal nenhuma deputada federal, nem senadora, foi eleita, e na Assembleia Legislativa Estadual só seis mulheres estão com mandato de deputada estadual e, fazendo ainda um recorte racial, todas essas mulheres são brancas. Já na Câmara Municipal, o cenário também não é diferente, com apenas quatro vereadoras atualmente eleitas e, se existir renovação de mandato, algo que preocupa é que isso pode diminuir ainda mais a presença de mulheres nesse espaço de decisão política. Ou seja, mulheres seguem sim tentando, se candidatando, porém os determinantes da violência política para com mulheres nos espaços de poder político, ainda seguem dificultando a maior representatividade feminina eleita”, argumenta a assistente social em contato com a reportagem da Tribuna Independente.

A pesquisa aponta, segundo ela, que a participação é cada vez maior. “Nossa pesquisa mostra, e dados do Tribuna Superior Eleitoral [TSE] também mostram, que existe um crescimento do número de mulheres no processo eleitoral, extremamente pequeno, a passos muito curtos, mas, se relacionado a anos anteriores, existe sim. Por exemplo, no último pleito, em 2022, existiu um crescimento de 18% [91 deputadas federais eleitas] quando em relação às 77 deputadas federais eleitas no pleito do ano de 2018. Então, sabemos que o direito de participação de mulheres na política partidária no Brasil foi conquistado de forma bem tardia, se formos comparar historicamente com outros países. A aprovação da cota de gênero também veio, e de certa forma contribuiu para que esse número começasse a aumentar, ainda que a passos bem lentos, e, mesmo em meio a todos esses pequenos avanços, ainda precisa se fazer muito para que aconteçam debates sobre e também exista contribuição e mobilização pra que essa desigualdade, que foi construída historicamente, seja urgentemente reparada”.

Constatação: no interior, mandato de vereadora é conduzido pelo pai

Professora e doutora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Andrea Pacheco, realizou uma pesquisa com mulheres eleitas aqui em Alagoas para cargos de vereadora e se deparou com situações inusitadas.

“Eu cheguei em um determinado interior e fui perguntar pela vereadora e falei o nome da vereadora, ninguém conhecia. Quando aí eu vi que na listagem da Uveal [União dos Vereadores de Alagoas] tinha ‘filha do fulano de tal’. Quando eu falei, reconheceram”. Ela pegou o endereço e foi até a vereadora, que revelou a realidade. “Quando eu cheguei lá, ela disse ‘olha o que que você quer saber? Porque na verdade é só o meu nome, o vereador é meu pai’”.

Essa foi a situação mais problemática, mas ela afirma que a maioria tinha o viés familiar. “Quando eu pergunto por que entrou na política, a maioria das mulheres fala ‘porque o meu pai é político, o meu irmão agora é perfeito, então precisava de alguém para continuar com a história da família para poder assumir’. O Estado de Alagoas, é um estado em que a participação da mulher da política vai se dar apenas via os familiares quando não tem mais o irmão, o tio, primo, alguém mais do sexo masculino. E quando não tem mais o filho, a mulher é escalada”.

Observando a Câmara de Maceió e a Assembleia Legislativa do Estado (ALE), as poucas parlamentares eleitas reproduzem esse modelo. Filhas, esposas ou irmãs são as únicas que obtiveram sucesso no pleito, apesar de não terem faltado nomes de mulheres sem linhagem familiar.

Para Andrea, isso tudo se deve a uma construção social. “Nessa nossa sociedade capitalista patriarcal, racista e heteronormativa de um modelo de cidadão que é o modelo do homem do sujeito universal, que é esse homem branco rico heterossexual. Então dentro dessa perspectiva, as mulheres são construídas, são ensinadas a ter o espaço privado, espaço doméstico, como o seu espaço natural. Já os homens, naturalmente, nasceram para o espaço público de trabalhar, de participar da política, de estudar, de fazer o mestrado, um doutorado longe”.

A professora universitária faz a ressalva de que mesmo com as dificuldades, ao longo da história, as mulheres buscam quebrar essa estrutura. “Então, as mulheres estão trabalhando em todas as profissões, mesmo ganhando ainda de forma diferenciada, estão fazendo mestrado e doutorado, entrando nos partidos políticos se candidatando e se elegendo”.

Manter interesse eleitoral é desafio

Na avaliação de Marli Araújo, professora doutora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), o fato de as mulheres serem a maioria que comparece às urnas no período das eleições, sejam elas gerais ou municipais, é mais uma prova de que falta de interesse pela política não é exatamente o problema.

À Tribuna Independente, a professora universitária analisa que é possível perceber que o discurso masculino culmina numa validação à ausência das mulheres nos espaços de poder.

“Talvez dizer que a gente não tenha interesse da política não seja um discurso nosso, seja um discurso masculino que valida a ausência de mulheres na política e nos espaços de poder. É perceptível como os processos de patriarcado, e as desigualdades de gênero fazem com que aparentemente o interesse de mulheres seja menor. Então, esse interesse não existe, ou ele é apagado dentro das estruturas patriarcais para que essas mulheres não se vejam enquanto o processo de poder que tem condições e legitimidade de acessar esses espaços de representação?”, questiona.

Marli Araújo acredita que a história do Brasil deixa resquícios de desigualdade que se tornam barreiras para a mulher ocupar esses espaços.

“O Brasil é um país colonizado. O poder no Brasil é branco, masculino e ele é heteronormativo. Então, esse mesmo discurso que faz com que aparentemente a gente não tenha interesse é o discurso que apaga esse interesse enquanto poder. Vai dizer assim, ‘não você não vai precisar porque você não tem o interesse’. Por exemplo, quando você pega os partidos políticos, não existem partidos políticos no caso hoje que são partidos fundados por mulheres. Todos os partidos políticos têm uma representação muito forte masculina, e qual é o nome que vai? É aquele nome que está ali historicamente. Quando a gente aprofunda isso dentro das estruturas que organizam esse país, a gente vai trazer um elemento raça, não é só mulheres, mas mulheres negras, mulheres trans que só acendem enquanto processos de bancada”.

Marli reforça que as mulheres normalmente participam ativamente, mas são silenciadas.

“Nós estamos o tempo todo na disputa, nós nunca deixamos de estar na disputa. A questão é que em alguns momentos dessa disputa vai estar mais aparente em outros momentos não. No último pleito teve mulheres, mas também teve as estratégias patriarcais de tirar essas mulheres. O machismo e o sexismo está o tempo todo se articulando para que a gente não chega a esses espaços, mas nós estamos sempre na disputa. Tanto é que nós continuamos com a nossa dupla, tripla jornada, mas estamos também nos processos de disputa, só que para a gente vai ser muito mais difícil chegar. Existem inúmeros elementos que para um homem não estão presentes, por exemplo, ele não vai ter dupla jornada de trabalho, ele não vai ter um grupo se articulando para desqualificá-lo do ponto de vista é político, para desqualificar enquanto homem, e nós mulheres, vamos ter tudo isso. O patriarcado está o tempo todo ON, está ligado. Não estamos disputando só com o candidato, nós estamos disputando com a estrutura de poder”, justifica.

Ela também observa que atualmente a porta para as mulheres parece ser a hereditária. “A gente tem historicamente a representação de mulheres na política ocupando os espaços que foram dos pais ou dos maridos, ou muitas vezes no nome projetado para ocupar esse espaço dentro de uma construção familiar que já tem uma história na política”. E nesse caso, o recorte de raça fica ainda mais difícil. “Qual é a mulher negra que você conhece com legado familiar na política alagoana? O corpo da mulher negra não chega disputando o poder no sentido de assumir o poder, como a mulher branca, ele chega discutindo o poder de um povo, e de um povo que historicamente precisa se colocar contra o poder estabelecido”, complementa.

Pauta feminista foi descredibilizada por Bolsonaro

Outra preocupação expressada pela professora e doutora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Marli Araújo, diz respeito à atuação das mulheres que são eleitas, principalmente quando não são oriundas de uma pauta feminista.

“Nem sempre uma mulher no cargo de poder necessariamente vai representar os interesses de mulheres. Essa é uma outra questão que a gente precisa debater. Eu posso chegar no cargo de poder, mas não quer dizer necessariamente que eu estou representando as mulheres, o que eu estou fazendo a defesa de mulheres. Os últimos quatro anos nos mostraram isso, mulheres que acenderam ao poder político necessariamente não estavam na defesa dos interesses das mulheres enquanto um coletivo”, pontua.

Em alguns espaços, a professora universitária percebe até retrocesso no contexto do que aconteceu no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), quando o mandatário reforçava o discurso de reduzir o papel social da mulher.

“Na última eleição na Câmara de Vereadores em Maceió, esse número reduziu bastante do a gente já tinha. Nos últimos quatro anos também quais mulheres que assumiram a política? Foi um governo que fez o discurso não só do apagamento, mas de fortalecimento de uma submissão”.

O avanço do discurso conservador que elegeu o ex-presidente foi fruto também de uma grande ofensiva que colocou a luta das mulheres como inimigas.

“Mulheres não são machistas, mas nós reproduzimos isso também é um elemento muito forte. O feminismo tem sido demonizado nos últimos anos no Brasil e isso não só no espaço político, mas também nos espaços e ocupação de qualquer outro espaço de poder. E aí eu vou levar um pouco para rede social, quando a gente vê hoje, o tempo todo, tanto discurso de homens como discursos de mulheres de reforçar submissão, de dizer que os espaços de poder são dos homens que as mulheres estão nos espaços privados e domésticos e lá devem permanecer, principalmente dentro de um perfil de mulher branca, classe média alta”.
Apesar disso, a professora universitária Marli Araújo, compreende que mesmo não tendo o olhar para a realidade de gênero, a eleição de mulheres acaba trazendo avanços.

“Querendo ou não, levar a demanda de mulheres é algo que também não pode não acontecer. Você tem que levar essa demanda de alguma maneira, enquanto uma mulher que está nesse cargo de poder de fato essa demanda vai ser atendida, porque são interesses políticos de manutenção do poder. Ela também não consegue se eleger se ela normalmente não levar uma pauta de mulheres. Não dá para ela passar quatro anos no mandato e, de alguma forma, não aparecer. Porque ela inclusive vai aparecer em campanha. Mesmo ela vindo desse legado familiar ela querendo manter esse legado familiar, mas é um corpo feminino na política”, conclui.

Existe a cobrança de uma atuação maior do Estado

Uma maior participação das mulheres na política e nos diversos cenários que o Brasil permite para tratar de política e eleições, por exemplo, também passa por uma atuação do Estado. É o que entende a professora e doutora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Andrea Pacheco.

“Eu acho que precisa de muitas políticas públicas em todos os âmbitos, desde a formação. O debate de informação, do que são estas instituições, de como elas se organizam, de como as mulheres podem pensar uma candidatura, toda essa construção que os homens já vão ter nesse contato direto, porque isso já é o que eles vão aprendendo, essa coisa do mando. Ou seja, existe essa necessidade de uma atuação maior do estado para que a mulher seja inserida neste debate dos espaços de poder”, destaca.

A professora universitária ressalta, ainda, que há muito mais facilidades para um homem sair em campanha e conseguir êxito nas urnas, sendo eleito, do que a mulher.

“Além disso também, é muito mais fácil para um homem se eleger, sair fazendo campanha, comício, ficar no sinal, ir para as reuniões do que a mulher que, por exemplo, tem dois filhos, três filhos, tem a casa ainda para cuidar. Porque as mulheres vão para o espaço público, mas não saem do doméstico. Elas continuam com as mesmas obrigações. Então como é que essas mulheres podem estudar, ir para reuniões políticas, articulações, fazer campanha? A gente precisa de um leque de política pública que assegura essa mulher”, reforça.




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