O senador Renan Calheiros, presidente do MDB de Alagoas, está fora da CPI da Braskem. Ele anunciou que não fará mais parte da Comissão Parlamentar de Inquérito, logo após ter sido preterido na relatoria da CPI. O presidente da Comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), escolheu o senador do PT sergipano Rogério Carvalho para a relatoria.
Apesar de ter dito, que a sua decisão não era uma posição isolada e de ter pedido ao senador alagoano que compreendesse a situação, Renan não aceitou as ponderações de Aziz e comunicou, de imediato, sua saída da Comissão que foi proposta por ele e da qual esperava ser o relator.
A escolha do relator foi apresentada na abertura dos trabalhos da Comissão, depois de um longo dia de discussões, nos bastidores do Senado. A sessão era para ter sido iniciada às 10 horas do dia (21), mas como não houve acordo (na escolha da relatoria), foi adiada para às 16 horas.
Na abertura dos trabalhos, o presidente da CPI da Braskem, Omar Aziz anunciou que o senador Rogério Carvalho seria o relator. O cargo era pretendido por Renan, mas a pressão da base governista terminou surtindo efeito e o senador alagoano terminou ficando de fora das investigações dos crimes da Braskem.
O presidente da CPI ainda tentou contemporizar a decisão do colegiado, dizendo que a escolha por outro relator não foi só dele, mas de nada adiantou. “Para que a gente possa ter uma relação isenta de pessoas ligadas de Alagoas, eu indico o senador Rogério Carvalho como relator”, justificou Omar Aziz.
Tão logo foi anunciado oficialmente o nome do senador Rogério Carvalho para a relatoria da CPI, o senador Renan Calheiros pediu a palavra e comunicou a sua saída da Comissão. Ele não aceitou nem mesmo o pedido de Omar Aziz e confirmou sua decisão de deixar a composição da comissão.
“Eu deixo a comissão por não concordar com o encaminhamento da relatoria”, afirmou Renan, ponderando acerca da escolha do senador sergipano. Segundo o senador alagoano, se o Caso Braskem tivesse ocorrido em Sergipe, ele abriria mão da relatoria para que Carvalho assumisse por ter mais conhecimento da situação na região.
“A designação do senador Omar Aziz do senador Rogério Carvalho é regimental, mas eu confesso que se houvesse um crime ambiental desta magnitude em Sergipe, eu lhe concederia essa oportunidade. E talvez a vossa excelência teria tido mais propriedade para acompanhar”, afirmou Renan.
PARTICIPAÇÃO
A CPI, que vai ocorrer estritamente no Senado, é composta por 11 senadores e sete suplentes, totalizando 18 vagas. Dentre os 18 representantes, apenas oito são do Nordeste. Todos os senadores de Alagoas iriam integrar a CPI, mas com a desistência de Renan, apenas os senadores Rodrigo Cunha (Podemos) e Fernando Farias (MDB), estão na comissão.
A CPI atende ao requerimento RQS 952/2023, apresentado por Renan e assinado por 46 senadores. O colegiado terá 120 dias para concluir seus trabalhos e disporá de um orçamento de R$ 120 mil reais. O foco das investigações são os crimes atribuídos à mineração predatória praticada pela Braskem em Maceió.
Carta-renúncia: senador seguirá lutando para punir a mineradora
Ainda ontem, no Senado, Renan Calheiros (MDB), encaminhou a carta-renúncia para lhe retirar da CPI da Braskem. Renan agradeceu aos 45 senadores que apoiaram a criação da comissão e citou que os moradores de Maceió continuam sofrendo com o descaso da empresa Braskem.
Confira o teor da carta-renúncia escrita pelo senador Renan Calheiros.
Devo um agradecimento aos 45 senadores e senadoras que subscreveram a criação da CPI, dentro da previsão constitucional de que o Parlamento é também uma Casa fiscalizadora. Devo um agradecimento sincero, de coração, ao povo sofrido de Alagoas, especialmente aos maceioenses, vítimas da barbárie e de um crime ambiental desumano, despudorado, certamente doloso. Quero ainda reconhecer os compromissos assumidos em relação a esta CPI, honrados pelo Presidente Rodrigo Pacheco.
Foi em nome das 150 mil vítimas que me movi para romper um pacto de silêncio criminoso que abafou o caso. Em 3 de março de 2018 a terra tremeu em Maceió. Desde então a terra treme incessantemente, gerando um pavor permanente e insegurança eterna. Um terremoto que abalou 5 bairros. Hoje são cidades fantasmas, sem vida, retratos da ruína e da devastação. Os levantamentos geológicos posteriores concluíram que a mineradora Braskem foi a responsável por todas as rachaduras. Uma mineração feita às cegas, resultante da imperícia, imprudência, incompetência e, ao longo dos anos, muita malícia. Maceió é hoje uma cidade sitiada pela ação criminosa de uma mineradora.
Nossa luta pela responsabilização incluiu esta CPI, mas não foi só. Ingressamos na Comissão de Valores Mobiliários, junto ao Tribunal de Contas da União, na Justiça com várias ações em diversas instâncias, no CNJ e propusemos essa investigação parlamentar. Nunca ouvi um argumento minimamente razoável para impedir a investigação. Dissimulações, meias palavras que sempre ocultaram uma advocacia envergonhada contra uma CPI nitidamente humanitária.
Um rastro de destruição, de dores, abriu cicatrizes hemorrágicas em 20% do território de Maceió. É um cenário desolador de bairros inteiros arrasados, os escombros desertificados como se ali houvera uma guerra, uma batalha longa, sangrenta e mortal. Houve essa guerra, de fato, mas ela foi desleal, desumana, inaudível para quase todos. Uma guerra em que só um lado dispunha de munição. Uma guerra em que só um lado atirou e outro tombou inerte. Essa guerra foi drenando o solo, sugando as esperanças, matando a memória afetiva, destroçando famílias, pulverizando sonhos, moendo vidas, triturando a dignidade, esvaziando ninhos e matando uma cidade, um pouco a cada dia. É um vasto cemitério de lembranças. É uma caverna fantasmagórica de incertezas, dúvidas e desamparo. Um sentimento de orfandade varre as ruas desertas, uma sensação de vazio oprime nosso povo, as casas estão destelhadas, as paredes ruindo nas casas ocas e ninguém mais dorme com os olhos perdidos no espanto e na perplexidade. Os buracos abertos pela Braskem não são físicos ou geológicos, estão eternizados na nossa alma.
Colocamos esta CPI de pé em um cenário de adversidade. A adversidade fortalece enquanto o conforto anestesia. Contra o poder econômico e alguns poderosos, mas com a força da verdade e da Justiça erguemos a CPI. Com os encaminhamentos que ensaiam domesticar a CPI não emprestarei meu nome para simulacros investigatórios. Jogos de cartas marcadas sempre acabam com a ruína de castelos de cartas. Já vi esse filme várias vezes.
Mãos ocultas, mas visíveis, me vetaram na relatoria, que não era uma capitania, mas o resultado de uma costura política. A saída do Senador Omar desfaz o acordo também para a relatoria. Não é uma capitulação, mas um reposicionamento estratégico. Na história há sucessos efêmeros e vãos, com alto custo e gosto amargo, como há vencidos que se tornaram heróis no julgamento histórico, que é impiedoso. Antes perder entre os justos do que triunfar junto aos vis.
Seguiremos buscando as punições e as indenizações na Justiça, no Ministério Público, no Tribunal de Contas, no Conselho Nacional de Justiça, na Comissão de Valores Mobiliários, nas cortes internacionais e onde for necessário. As guerras não são vencidas em uma única batalha. Há uma enorme caverna latejando e ruindo. Aos que querem camuflá-la, alerto que a tragédia de Maceió não acabou. Está se dando dia a dia. Se hoje os alagoanos perdem o sono, em breve os poderosos que tentam escapar da Justiça, perderão muito mais.